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O ESCÂNDALO PROTESTANTE (parte II)


Segue a segunda parte da tradução do prefácio da obra controvérsia de São Francisco de Sales.

Aos Senhores de Thonon (França)

Senhores, Razão e vantagens da presente obra

Tendo-me dedicado por algum tempo à pregação da Palavra de Deus em vossa cidade sem ter sido ouvido por vós, a não ser poucas vezes, por pouco tempo e às ocultas, para que da minha parte não reste mais nada por fazer, resolvi colocar por escrito alguns dos principais raciocínios, selecionados na maior parte das vezes dos sermões e discursos que até agora pronunciei de viva voz em defesa da Fé da Igreja.

Gostaria muito de ter sido ouvido da mesma forma que os acusadores, pois as palavras que na boca são vivas morrem no papel. Diz São Jerônimo: “A viva voz possui não sei que espécie de vigor secreto que o golpe dirigido ao coração é mais certeiro pela palavra do que pelo escrito” (Epíst. 53,8,2 [a Paulino]); e isto escreveu o Apóstolo São Paulo: “Como eles crerão naqueles que não ouviram? E como ouvirão sem que haja um pregador? A fé é para o ouvido e, o ouvido, para a Palavra de Deus” (Romanos 10,14-15.17).

Portanto, eu preferia ter sido ouvido; mas na falta disto, o presente escrito não carecerá de ter muitas vantagens:

1º) Porque levará para as vossas casas aquilo que não quisestes receber reunidos na nossa [casa];

2º) Porque alegrará aqueles que, pelas respostas aos meus raciocínios, dizem que gostariam de ver [os hereges] diante de algum ministro, parecendo-lhes [agora] que só a [mera] presença do adversário os faria vacilar, empalidecer, dispersar e calar. Já agora poderão fazê-lo (=responder aos hereges);

3º) Porque é possível manejar melhor o escrito, dá mais espaço para a consideração do que voz e pode ser meditado em maior profundidade;

4º) Porque assim se verá que se eu desaprovo mil impiedades que são imputadas aos católicos, não o faço com o ânimo de fugir do combate – como alguns disseram – mas para seguir a santa intenção da Igreja; pois para isso o coloco por escrito, à vista de cada um e sob a censura dos [meus] superiores, pois estou seguro de que há muita ignorância entre eles, porém, por Deus, nem sombra de irreligião, nem coisa alguma contrária às declarações da Igreja Romana.

***

Humildade do autor e dedicação da obra

Devo, no entanto, assegurar – para desencargo da minha consciência – que estas considerações não me moveram a escrever, por ser este um ofício juramentado que cabe aos doutos e aos entendidos mais polidos. Para escrever bem é necessário conhecer bem: os entendidos medíocres devem se contentar com o dizer e com a voz; a ocasião e o continente darão o brilho à palavra. Já o meu [entendimento], que é dos mais pobres, ou melhor, da mais baixa marca dos medíocres, não pode triunfar neste exercício, de modo que não teria pensado em fazê-lo se um nobre cavaleiro, pessoa séria e prudente, não me tivesse encorajado e dado valor para isso, o que depois pareceu bem a muitos de meus principais amigos, cuja opinião estimo mais ainda, já que considero que a minha própria [opinião] não vale nada para mim, na falta da [opinião] alheia.

Assim, coloquei aqui algumas das principais razões da Fé católica, que mostram claramente que é grave pecado que cometem os que permanecem separados da Igreja Católica, Apostólica e Romana. Por isso vos dedico [essas razões] e as apresento de boa vontade, esperando que oportunidades que vos impediram de me ouvir não tenham [agora] força para impedir que leais este escrito. De passagem, asseguro-vos que jamais lereis qualquer outro escrito que vos será dedicado por um homem mais desejoso do que eu de vosso bem espiritual.

Posso também acrescentar que jamais um mandado foi recebido por mim com maior disposição para cumpri-lo do que esse que me foi dado por nosso Reverendíssimo Senhor Bispo ao ordenar-me, atendendo aos santos desejos de Sua Alteza, cuja carta depositou em minhas mãos: que eu viesse aqui para trazer para vós a Santa Palavra de Deus. Nunca pensei poder prestar para vós melhor serviço do que esse. E, a bem da verdade, eu acreditava que gostaríeis de ouvir o que eu vos trazia (já que não admitís como lei que mereça crédito senão a interpretação da Sagrada Escritura que vos pareça melhor), isto é, a [interpretação] da Igreja Apostólica Romana, que jamais havia chegado até vós senão manchada, desfigurada e contraditada pelo inimigo, o qual sabia muito bem que se a tivésseis visto em toda sua pureza, jamais a teríeis abandonado.

Conclusão da Carta

Os tempos são difíceis: só com muito trabalho o Evangelho da Paz pode penetrar entre tantos clamores de guerra; mas, se não perdeu o valor, estes frutos tardios se conservarão melhor que os anteriores. Espero que se alguma vez Nosso Senhor venha a gritar aos vossos ouvidos o seu santo ‘Epheta’ (cf. Marcos 7,34) esta demora fará com que o triunfo ganhe maior firmeza.

Recebei, pois, senhores, com agrado o presente que vos faço e lede com atenção as minhas razões. A mão de Deus não está fechada nem é parcial, e mostra de bom grado seu poder em sujeitos ruins e grosseiros. É justo, ademais, que tendo vós ouvido uma das partes ouçam também [agora], com paciência, a outra. Tomai também – e a isto vos conjuro em nome de Deus – tempo e espaço para amadurecer vossos entendimentos às verdades que vou expor para vós, e, em juízo de tamanha importância, rogai a Deus que vos assista com o seu Santo Espírito, remetendo-vos à salvação. Rogo sobretudo que não deixeis adentrar em vossas almas outra paixão além daquela de vosso Salvador e Mestre, pela qual todos nós fomos redimidos e seremos salvos, se cooperarmos, “pois Ele deseja que todos os homens sejam salvos e venham ao conhecimento da verdade” (1Timóteo 2,4).

À Sua Santa Majestade rogo que lhe compraza me ajudar – e a vós também – neste assunto.

Dado no Dia da Conversão de São Paulo (=25 de janeiro de 1595).

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