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VIGÉSIMA SÉTIMA HOMILIA DE SÃO JOÃO CRISÓSTOMO SOBRE A 2CARTA AOS CORÍNTIOS

VIGÉSIMA SÉTIMA HOMILIA DE SÃO JOÃO CRISÓSTOMO SOBRE A 2CARTA AOS CORÍNTIOS

11. Procedi como insensato! Vós me constrangestes a isto. A vós é que tocava recomendar-me.

Terminado o discurso sobre o louvor de si próprio, o Apóstolo não se detém, mas novamente se escusa, e pede desculpas, dizendo que agiu induzido pela necessidade, não por vontade própria. Todavia, apesar de obrigado, denomina-se insensato. Ora, quando elaborava o discurso, dizia: “Suportai-me como insensato” e: “como insensato”; agora, omite a partícula: “como” e simplesmente denomina-se insensato. Após proferir o que queria, destaca livre e audaciosamente este vício, instruindo a todos que, exceto por extrema necessidade, não se elogiem, visto que Paulo, apesar de o fazer por necessidade, denomina-se insensato. Em seguida, passa a atribuir a causa aos discípulos e não aos falsos apóstolos: “Vós me constrangestes”. Se eles se jactassem sem vos defraudar, nem levar à perdição, não teria me rebaixado a tais palavras; uma vez, contudo, que prejudicam a toda a Igreja, fui obrigado, visando ao bem, a incidir no vício da insipiência. E não disse: Receei que se obtivessem a primazia entre vós, implantassem seus dogmas; ele o fez mais acima, nesses termos: “Receio, porém, que, como a serpente seduziu Eva por sua astúcia, vossos pensamentos se corrompam”; agora, contudo, não age de forma idêntica, mas com maior autoridade e poder, de sorte que, em vista dos antecedentes, tivesse a faculdade de falar mais livremente: “A vós é que tocava recomendar-me”. Depois, apresenta a causa. E mais uma vez não menciona apenas as revelações e milagres, mas também as provações.

Pois em nada fui inferior a esses eminentes apóstolos, Vê como fala com maior liberdade e autoridade. Antes dizia: “Julgo não ser inferior”. Aqui, porém, pronunciando de modo absoluto, conforme disse, depois de apresentar as provas, fala livremente, mas nem assim se aparta de seus hábitos modestos. Por conseguinte, como se tivesse dito algo de grandioso e excedido os limites da dignidade por se ter agregado ao número dos apóstolos, de novo suaviza o discurso: se bem que eu nada seja.

12. Os sinais que distinguem o apóstolo realizaram-se entre vós. Diz ele: Não consideres se sou insignificante e de pequeno valor; mas se não recebes o que se deve esperar de um apóstolo. Nem disse: Insignificante, mas o que era bem menos: “Nada”. Que importa seres grande, se a ninguém és útil? Nada vale ser médico perito, se não cura doente algum. Não ponderes, portanto, que nada sou, mas consideres que a fim de prestar benefícios adequados nada me faltou, mas ofereci minha experiência de apóstolo. Não importava, portanto, recomendar-me. Certamente não o dizia porque precisasse de recomendação. Como precisaria, se menosprezava até o céu por amor a Cristo? Mas desejava a salvação deles. Em seguida, para que não dissessem: O que nos importa seres em nada inferior aos mais ilustres apóstolos? Por isso acrescentou: Os sinais que distinguem o apóstolo realizaram-se entre vós: paciência a toda prova, sinais milagrosos, prodígios e atos portentosos.

Ah! Em poucas palavras atravessou um oceano, uma quantidade de boas obras! E vê o que coloca em primeiro lugar: a paciência. É sinal característico do apóstolo: Suportar tudo com fortaleza. Incluiu-o brevemente nesta palavrinha; ao contrário, os milagres, que não praticava por próprio poder, enumerou de modo extenso. Pondera quantos cárceres, quantas chagas, quantos perigos, quantas insídias, quantas nevadas de provações implicitamente assinala, quantas guerras intestinas, quantas exteriores, quantas dores, quantos ataques classifica sob um vocábulo único: paciência. Entre os milagres apontou quantos mortos ressuscitados, quantos cegos curados, quantos leprosos purificados, quantos demônios expulsos.

Ao ouvi-lo, aprendamos que, se determinada necessidade surgir, obrigando-nos a narrar nossas boas obras, brevemente as enunciemos, conforme Paulo fez. Logo, a fim de que ninguém replique: Embora sejas grande e operaste muitas obras, entretanto não tantas nem tão grandes como os apóstolos nas demais Igrejas; por isso acrescentou: Que tivestes a menos do que as outras Igrejas Não recebestes graça menor que as demais. Ora, retrucará talvez alguém, por que, abandonando a discussão com os falsos apóstolos, volta-se para os apóstolos? Quer principalmente animá-los, e mostrar não só que é mais importante do que os falsos apóstolos, mas que nem mesmo aos grandes é inferior. Por isso, na verdade, ao dissertar sobre eles, diz: “Muito mais eu”. Ao se comparar com os apóstolos, contentou-se com dizer que de forma alguma é inferior a eles, e até trabalhou mais. Ora, assim também indica que os injuraria se, apesar de ser igual, se colocasse abaixo de tais apóstolos.

senão o fato de que não vos fui pesado?

Novamente admoesta com grande vigor. E o que se segue ainda é mais áspero: Perdoai-me esta injustiça!

E todavia esta aspereza contém palavras de benevolência e louvor relativamente aos coríntios. Consideravam injusto que o Apóstolo não se deixasse convencer de receber algo da parte deles, nem depositava neles tanta confiança a ponto de aceitar a subsistência. Se por isso, diz ele, me acusais. Não disse: Vós me acusais, e sim com grande suavidade: Perdoai-me. E nota sua prudência! Uma vez que assiduamente os envergonhava a respeito deste assunto, assiduamente o mitiga. Mais acima dissera: “Pela verdade de Cristo que está em mim, declaro que este título de glória não me será arrebatado”. Ainda profere: “Por que não vos amo? Deus o sabe! A fim de tirar todo pretexto àqueles que procuram algum para se gloriar dos mesmos títulos que nós!” (2Cor 11,10-12). E na primeira carta: “Qual é então o meu salário? É que, pregando o evangelho, eu o prego gratuitamente” (1Cor 9,18). E aqui novamente: “Perdoai-me essa injustiça!” Sempre toma a precaução de não pôr em evidência que é por causa da fraqueza deles que nada aceita. Por isso aqui se expressa: Se o considerais uma culpa, peço perdão. Assim se exprimira para simultaneamente feri-los e curá-los. E não me digas: Se desejas ferir, porque empregas desculpas? Se curas, por que feres? É próprio de um espírito prudente cortar e fazer um curativo no lugar ferido. Depois, conforme dizia anteriormente, para não parecer que sempre insistia no fato de ter recebido de outros, elimina esta suspeita como na primeira carta, ao dizer: “Nem escrevo estas coisas no intuito de reclamá-las em meu favor. Antes morrer que… Não! Ninguém me arrebatará esse título de glória!” (1Cor 9,15). Aqui, na verdade, ele o faz com mais suavidade e brandura. De que modo?

14. Eis que estou pronto a ir ter convosco pela terceira vez, e não vos serei pesado; pois não procuro os vossos bens, mas a vós mesmos. Não são os filhos que devem acumular bens para os pais, mas os pais para os filhos.

O sentido é o seguinte: Não é porque nada recebo que não vou vos ver; fui uma segunda vez, e estou pronto a ir visitar-vos pela terceira, sem vos ser pesado. E a causa é grave. Com efeito, não disse: Porque sois avaros, porque estais ofendidos, porque sois fracos. Mas, qual é? “Pois não procuro os vossos bens, mas a vós mesmos”. Peço algo de maior, as almas em vez de riquezas, a salvação em vez de ouro. Em seguida, porque era duvidoso se ele ainda estava aborrecido, explica também o motivo. Uma vez que era provável que dissessem: Acaso não nos é lícito possuir o que é nosso? com muita suavidade acrescenta uma defesa nos seguintes termos: “Não são os filhos que devem acumular bens para os pais, mas os pais para os filhos”. Coloca pais e filhos em vez de mestres e discípulos, e demonstra que ele cumpre determinado ofício, apesar de ser facultativo. Pois Cristo não o ordenou, mas, poupando-os, emprega estas palavras e acrescenta algo. Não disse apenas: Não são os filhos que devem acumular bens para os pais, mas ainda que é dever dos pais acumular para os filhos. Por conseguinte, sendo preciso dar…

15. Quanto a mim, de bom grado despenderei, e me despenderei todo inteiro, em favor de vossas almas. De fato, a lei natural ordena que os pais acumulem bens para os filhos; eu, porém, não contente com isto, me despenderei por vós. E é incrível que não somente não receba, mas ainda por cima despende; e não simplesmente, mas com grande magnanimidade e tira do que lhe falta. A locução: “Me despenderei todo inteiro” o sugere. Pois, mesmo que seja preciso dar da própria carne, não recusarei em prol de vossa salvação. E prossegue, unindo ao amor uma acusação:

Será que, dedicando-vos mais amor, serei, por isto, menos amado? Faço-o por aqueles que amo, apesar de ser menos amado. Considera os graus da questão. Devia receber e não recebia: primeira bela ação. Oprimido pela penúria: segunda. E anunciava-lhes a palavra: terceira. Além disso despende: quarta. Não só despende, mas com largueza: quinta. Não apenas dinheiro, mas a si próprio: sexta. E em favor daqueles que não o amavam muito: sétima. Finalmente por aqueles que amava mais intensamente: oitava.

Imitemo-lo. É grande pecado (invejar e) não amar; é maior não retribuir. De fato, quem só retribui o amor não é melhor do que os publicanos e aquele que nem isto faz é pior que as próprias feras. O que dizes? Não retribuis a quem te ama? Por que vives? Para que serves? Com que finalidade? Política ou particular? Não, absolutamente. Nada mais inútil do que o homem que não sabe amar. Aceitaram esta lei muitas vezes os ladrões, os assassinos, os ladrões, e os que comeram sal em comum, transformaram-se, mudaram de costumes devido à participação da mesa em comum; tu, contudo, tens em comum com o próximo não só o sal, mas as palavras e as obras, entradas e saídas e não o amas? Mas, os amantes torpes gastam tudo com meretrizes; tu, contudo, cujo amor é honesto, de tal forma és frio, fraco e covarde que não podes amar mesmo sem dispêndio? Mas quem é tão miserável, de costumes tão selvagens que tenha aversão e ódio a quem o ama? Fazes bem em não crer em tal absurdo; e se eu demonstrar que há muitos desta espécie, seria tolerável tal vergonha? Pois, se falas mal de quem te ama, ou não o defendes diante de um detrator, e o invejas na prosperidade, que amor é este? Não é suficiente comprovação de amizade estar isento de inveja, não odiar a quem ama, não combatê-lo, mas é preciso protegê-lo e promovê-lo. O que há de mais miserável do que fazer e falar o possível para rebaixar o próximo? Ontem, no passado eras amigo, participavas do diálogo e da mesa; logo, porém, que prospera um membro de teu corpo, rejeitas a falsa amizade e te revestes de inimizade, ou antes, de furor. De fato, é evidente furor afligir-se diante da prosperidade do próximo; é furor de cães raivosos. À semelhança deles, estes também, no auge da inveja, saltam em cima. É melhor ter lombrigas enroladas nas vísceras do que sentir a inveja a rastejar interiormente. De fato, muitas vezes é possível expelir a lombriga por meio de medicamentos e aquietá-la com alimentos; a inveja, contudo, não se revolve nas vísceras, mas penetra no íntimo da alma e é vício que dificilmente se extirpa. A lombriga dentro do corpo humano não o toca, se lhe for fornecido alimento; ao invés, a inveja, mesmo se lhe forem postas inúmeras mesas, corrói a alma, mordendo de todos os lados, despedaçando, arrastando; não é possível achar alívio que lhe diminua o furor, exceto um, a saber, sobrevir uma tribulação ao homem feliz. Deste modo a doença decresce, ou antes, nem assim. Até mesmo que ao primeiro atinja alguma aflição, o invejoso, diante da alegria e felicidade de um outro, sente as mesmas dores; em toda parte traumas, em toda parte feridas. E não é possível aos que vivem na terra não encontrar homens felizes. Tão grande é a intensidade da moléstia que mesmo se o invejoso ficar trancado dentro de casa, invejará os antigos já falecidos. Ora, são duros estes padecimentos para os que vivem entre os homens, mas não são graves; quanto aos que se libertaram dos tumultos contrair esta doença, é o que há de mais doloroso. Preferia passar estes fatos em silêncio. Seria vantajoso nada dizer se o silêncio apartasse esta vergonha. Se me calar, porém, os acontecimentos haverão de clamar mais alto do que minha língua; portanto, minhas palavras não vos causarão dano por revelação dos vícios, e talvez conseguirão produzir fruto e proveito. Esta doença atinge também a Igreja, e tudo revoluciona, rompendo a unidade do corpo; e nós nos combatemos mutuamente, com a arma da inveja. Por isso existe enorme depravação. Pois há grande progresso à medida que todos edificam e os discípulos se mantêm eretos; se todos buscamos destruir, qual será o fim?

O que fazes, ó homem? Julgas ser útil derrocar os bens do próximo; mas antes de destruí-lo, abates o que é teu. Não entre os que plantam, os agricultores, como todos concorrem para um único fim? Um cava, outro planta, outro cobre as raízes, outro rega o que foi plantado, outro cerca com sebe e muro, outro afasta os animais; todos visam a idêntica meta: conservar incólume a planta. Em nosso caso, porém, tal não acontece; eu planto, e outro abala e sacode. Deixe ao menos que ela se consolide para adquirir maior vigor antes do golpe hostil. Não arruínas minha obra, e sim aniquilas a tua. Eu plantei, tu devias regar. Se a sacodes, arrancas inteiramente a raiz, nem terás o que irrigar. Acaso vês ser elogiado aquele que planta? Não temas! Nem eu sou alguma coisa, nem tu: “Aquele que planta, nada é; aquele que rega, nada é” (1Cor 3,7); é inteiramente obra de Deus. Lutas e guerreias contra ele quando arrancas o que foi plantado. Por conseguinte, enfim devemos nos arrepender e estar vigilantes. Não tanto receio a guerra externa quanto a luta intestina. De fato, a raiz, firmada na terra, nada sofre da parte dos ventos; ao invés, se um verme a corrói internamente, abala-se, e cai sem que ninguém lhe faça mal. Até quando a raiz da Igreja será corroída por vermes? Tais vermes nascem também da terra, ou antes, não da terra, mas do esterco, porque saem da podridão; e nem se abstêm dos abomináveis curativos das mulheres. Enfim, mostremo-nos homens fortes; tornemo-nos pugilistas da sabedoria, extirpemos o acúmulo de males. Com efeito, vejo agora a multidão da Igreja, qual um corpo exânime, prostrado no chão. E num cadáver recente, veem-se olhos, mãos, pés, pescoço e cabeça, mas nenhum membro exerce sua função; igualmente em nosso caso todos os presentes têm fé, contudo, não atuante, porque extinguimos o fervor, e fizemos do corpo de Cristo um cadáver. Se é horripilante de se dizer, muito mais horrível, na verdade, é vê-lo realmente. De fato, temos o nome de irmãos, mas na realidade somos inimigos; e todos nos denominamos membros, e à guisa de feras, dissentimos entre nós. Não proferi essas coisas no intuito de ridicularizar o que é nosso, mas para vos incutir pudor e vos converterdes. Determinada pessoa foi a uma casa e foi recebida com honras. Devias dar graças a Deus, porque um membro teu é respeitado e Deus é glorificado; tu fazes o oposto. Tu o deprecias junto daquele que o honrou; desta forma simultaneamente suplantas os dois e te marcas com uma nota ignominiosa. Qual o motivo, ó miserável e infeliz, de te entristeceres, ao ouvires um irmão ser louvado por homens ou mulheres? Acresce os elogios e igualmente obterás louvores. Se diminuíres os louvores, primeiro terás falado mal de ti mesmo, adquirindo má fama e além disso elevando-o ainda mais. Ao ouvires elogiar o próximo, procura participar do que se diz, se não pela vida e virtude, ao menos por te alegrares com as virtudes alheias. Alguém o louvou? Admira também tu; assim ele te elogiará como a um homem honesto e benigno. Não temas que, pela proclamação das virtudes alheias, as tuas fiquem diminuídas; isto só acontece nas delações. O gênero humano por natureza ama as disputas. Ao verificar que falas mal, aumenta os louvores para desta forma te excitar e serem repreensíveis os acusadores diante de si mesmos e condenados pelos demais. Vês quanta torpeza causamos? De que modo perdemos e dispersamos o rebanho? Enfim tornemo-nos membros, enfim um só corpo. E quando a alguém se conferem louvores, rejeite-os e transfira os elogios para o irmão; quem, porém, escuta louvores a um outro, congratule-se com ele. Unidos deste modo entre nós, conciliaremos a propiciação de nossa Cabeça; do contrário, se entre nós estivermos divididos, apartaremos o auxílio de Deus; por esta privação, o corpo contrai imenso mal porque tem a união estreita que vem de cima. Abracemos, portanto, o amor e a concórdia, expelindo qualquer ciúme e inveja, e desprezando a opinião do povo, a fim de não nos advirem estes males. Deste modo conseguiremos os bens presentes e futuros. Possamos obtê-los pela graça e amor aos homens de nosso Senhor Jesus Cristo, ao qual com o Pai, na unidade do Espírito Santo, glória, império, honra, agora e sempre e pelos séculos dos séculos. Amém.

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